Aumento da produtividade no Pantanal não se sustenta a longo prazo, diz ambientalista

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Representante do Ministério do Meio Ambiente defendeu uma política de compensação ao fazendeiro tradicional, que respeita o bioma

A produção no Pantanal sul-mato-grossense pode ser resumida em dois sistemas: o tradicional, que mantém a vegetação e espécies nativas; e o moderno, que substitui as vegetações nativas por exóticas e traz espécies da fauna que não são comuns do bioma.

O segundo, a curto prazo, é mais produtivo – e lucrativo -, mas não se sustenta, como explica a ambientalista e titular da Secretaria Nacional de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais (SBio) do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Rita de Cássia Mesquita.

“Quando você começa a substituir por espécies exóticas e um menor número de espécies, monocultivos, você pode até aumentar a produtividade por área, pode ter mais cabeça de boi, mas no longo prazo isso não se sustenta, porque você perde outras coisas que são muito fundamentais: a proteção do solo, a água, e a biodiversidade”.

Rita veio a Mato Grosso do Sul para o fórum Pontes Pantaneiras, realizado em Campo Grande. Na tarde desta quinta-feira, participou da mesa-redonda com o tema “Valorização do capital natural do Pantanal em benefício dos pantaneiros”.

Em entrevista exclusiva ao Correio do Estado, Mesquita defendeu a adoção de uma política de compensação para os produtores que praticam a pecuária tradicional, respeitam a vegetação nativa e estejam alinhados com a preservação do bioma.

“É preciso compreender que sim, de fato a região tem uma tradição na pecuária, mas a pecuária como ela foi praticada historicamente, tradicionalmente, é uma pecuária que, de certa forma, mantém muito da vegetação nativa e das espécies. Eu acho que é preciso compensar esse produtor, desse sistema tradicional, para diminuir essa distância entre um sistema e o outro”, destacou.

Para a secretária, a falta de incentivos por parte do poder público faz com que o produtor pense apenas nas questões econômicas, no lucro, ao invés de levar em consideração também os impactos que a atividade vai causar no bioma. Além de compensação financeira, Rita é a favor de certificados de reconhecimento, para promover também credibilidade àquele produtor.

“Se a gente conseguir construir incentivos e compensações, ele [produtor] vai ter menos boi por área, mas vai ter um retorno financeiro que pode, inclusive, ser até maior. Principalmente se vier agregado com um reconhecimento da contribuição para a biodiversidade, um reconhecimento da contribuição para o recurso hídrico, tudo isso. Então, o que nós precisamos fazer é diminuir essa diferença, de modo que esse produtor, que pode continuar produzindo no sistema tradicional, seja remunerado por isso, porque ele está contribuindo para outros serviços que não tem ninguém pagando”, afirmou.

O pensamento de Mesquita vai ao encontro do discurso do Governador do Estado, Eduardo Riedel, na tarde da última quarta-feira (16), durante a abertura do fórum Pontes Pantaneiras. Na ocasião, Riedel revelou que estuda criar uma linha de crédito para os produtores rurais que têm propriedade no bioma e estejam alinhados com a proposta de conservação ambiental.

“Medida acertada”

Nesta quarta-feira (16), o Governo do Estado publicou um decreto que “suspende a concessão de licença ou de autorização de supressão vegetal para uso alternativo do solo na Área de Uso Restrito da Planície Pantaneira e do Bioma Pantanal”.

Para Mesquita, Eduardo Riedel acertou ao tomar a medida, principalmente porque se mostrou disposto a dialogar com todas as partes interessadas no tema.

“Eu acho que o governador tomou uma medida muito acertada, porque o que ele propôs, daquilo que eu entendi, é que ele quer abrir uma conversa para poder ouvir as comunidades técnicas, científicas”, comentou.

O decreto é temporário, e será mantido até uma nova “Lei do Pantanal” for elaborada. A decisão veio à tona porque o decreto anterior (n° 14.273), assinado pelo ex-governador Reinaldo Azambuja em 2015, permitia desmatamento de até 60% da vegetação nativa (não arbórea) e de até 50% das árvores das áreas de fazendas, o que vai contra a supressão máxima recomendada apontada pela Embrapa, de até 35% da vegetação nativa.

A secretária destaca que o Ministério do Meio Ambiente está interessado em ser parceiro de Mato Grosso do Sul para construir a política de restauração do Pantanal.

“O Ministério do Meio Ambiente quer ser parceiro, quer estar presente, justamente para poder construir uma política melhor amparada em boa ciência, porque a melhor evidência é aquela que vem de um conhecimento técnico-científico”, concluiu.

Rita Mesquita

Nomeada para o cargo em março deste ano, Rita de Cássia Mesquita é Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Minas Gerais (1985), mestre em Biologia (Ecologia) pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) (1989) e doutora em Ecologia de Ecossistemas pelo Institute of Ecology, na University of Georgia (1995), nos Estados Unidos.

Em 2004, foi nomeada secretária adjunta de gestão ambiental da Secretaria de Meio Ambiente do estado do Amazonas, cargo que permaneceu até 2008. No período, atuou diretamente na implementação de unidades de conservação ambiental no estado.

Após sair da secretaria, se tornou coordenadora do Jardim Botânico de Manaus e Diretora Técnica do Museu da Amazônia (MUSA). Em 2010, criou o Mestrado Profissional em Gestão de Áreas Protegidas no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, onde foi coordenadora até 2016.

Antes de assumir a Secretaria Nacional de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais (SBio) do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), estava responsável pela Coordenação de Extensão do INPA, onde trabalhava em prol da divulgação científica.

SBio

Em resumo, a Secretaria Nacional de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais (SBio) do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) é responsável por propor políticas, normas e definir esratégias para a preservação de florestas, garantir conservação e uso sustentável da biodiversidade, proteger e recuperar espécies da flora, da fauna e de microorganismos ameaçados de extinção, e defender os direitos dos animais.

Pontes Pantaneiras

O maior evento com foco na conservação e no uso sustentável do Pantanal teve início na última quarta-feira (16) e segue até sexta-feira (18).

Durante os três dias de fórum, 15 mesas redondas e painéis reunem mais de 100 painelistas para debater casos de sucesso de conservação e refletir sobre mudanças positivas que valorizam o povo, a cultura e o capital natural. (Confira a programação aqui).

Dentre os assuntos abordados, estão os desafios para o desenvolvimento de estratégias voltadas para oferecer alternativas de renda, conservar a biodiversidade e promover a pecuária sustentável no bioma.    

Uma das maiores metas do encontro é aumentar a visibilidade do Pantanal brasileiro em âmbito nacional e internacional. Outro foco é incentivar alianças entre fazendeiros, comunidades tradicionais e povos indígenas para troca de experiências, projetos inovadores e iniciativas para a sustentabilidade, bem como atrair investidores para contribuir com o desenvolvimento sustentável do bioma.

O Pontes Pantaneiras é realizado pelo IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas, a Embrapa Pantanal, a University College London, o Smithsonian Institution e o ICMBio/CENAP, com o apoio da Embaixada e Consulados dos Estados Unidos no Brasil.

Fonte/créditos: https://correiodoestado.com.br/cidades/aumento-da-produtividade-no-pantanal-nao-se-sustenta-no-longo-prazo/418922/

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